Um mundo feliz de Aldous Huxley é o romance que trouxe à popularidade, quase um século atrás, o tema do futuro distópico, a utopia corrompida que vimos nos últimos anos representada por sagas de filmes como Jogos Vorazes, Maze Runner ou Divergente.
A história nos mergulha imediatamente em um mundo futurista que conseguiu se levantar do que aparentemente parece ser uma última grande guerra. Esta civilização garantiu uma harmonia perfeita ao proibir a reprodução natural e, em seu lugar, implementar a produção artificial de seres humanos com diferentes características, mantendo assim as classes sociais, e doutrinando-os desde bebês para aceitar os parâmetros sociais impostos a eles, o que lhes permite viver em um eterno estado de submissão e felicidade.
O protagonista da primeira parte da história se chama Bernard Marx (uma clara alusão ao pai do comunismo). Bernard é um alfa-mais, a classe social mais alta no metaverso de Um mundo feliz, então ele desfruta de uma inteligência muito superior à média. No entanto, devido a um suposto erro de fábrica, o jovem não tem a aparência de alguém de sua categoria, sendo consideravelmente mais baixo do que os outros alfas. Esse fato, somado à sua inteligência, o faz questionar o sistema em que vive, transformando-o em um pária. A curiosidade o leva a uma viagem para fora da civilização, uma reserva onde os humanos ainda se reproduzem naturalmente e as costumes e convenções a que o leitor está acostumado ainda são uma realidade. Aqui é onde começa a segunda parte do romance e o personagem mais importante de todos é introduzido: o Selvagem.
O Selvagem é um dos habitantes da reserva e filho de uma alfa-mais que ficou perdida na reserva por décadas. Devido à sua herança genética, ele é mais inteligente, forte e atraente do que a maioria das pessoas em sua comunidade, sendo por isso desprezado e excluído de todas as atividades cerimoniais. Sentindo que não faz parte daquele mundo e tendo ouvido histórias maravilhosas de sua mãe sobre a civilização, o Selvagem decide retornar com Bernard para o novo mundo. Já lá, ele se depara com a desagradável surpresa de que a aparente felicidade que o homem civilizado professa não é o que ele esperava.
Um mundo feliz não se destaca em comparação com outras obras em termos narrativos e o autor não assume muitos riscos ao organizar a história, algo compreensível, sendo esta sua primeira obra. No entanto, o valor do romance reside principalmente na inteligente sátira social que vai tomando forma ao longo da história, o que sempre foi a característica principal de um romance distópico bem conseguido. Um mundo feliz é uma crítica à sociedade do século XX, lidando com temas como industrialização acelerada resultante da revolução industrial, comunismo, a divinização da cultura do consumismo na forma do messias Henry Ford e a desumanização diante das novas tecnologias, temas que continuam sendo relevantes e próximos nos tempos modernos.
Os personagens são interessantes e suas personalidades únicas ajudam a trama a se desenrolar melhor. Bernard não assume o papel de protagonista heróico como se poderia pensar. Embora a princípio pareça ser o arquétipo do personagem insatisfeito com a sociedade ou um revolucionário, conforme a história avança percebemos que na realidade ele representa o que se pode chamar de hipocrisia dentro da revolução: o crítico que aspira fazer parte daquilo que critica; algo que se torna evidente na segunda parte do romance. O Selvagem também não pode ser considerado um herói, sendo simplesmente uma vítima das circunstâncias. O Selvagem é todos nós, ele pensa o que pensamos, diz o que diríamos e age de forma que nos é impossível julgá-lo. Ele é nossa porta de entrada na história, o personagem mais humano e uma fonte de moralidade como conhecemos agora.
Um mundo feliz é um daqueles livros que ficam com você por muito tempo, te obrigando a discutir e pensar, desafiando seus princípios morais e te fazendo refletir sobre coisas que anteriormente consideraria certas. Eficiência contra moralidade. Felicidade contra alma. O que é, afinal, aquilo que nos faz humanos? Leiam este livro e, com um pouco de sorte, encontrarão mais perguntas do que respostas.
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